Teste do olhinho é importante, mas não é suficiente para detectar alterações. Nordeste só tem um equipamento capaz de documentar evolução do bebê.
Um grupo de pesquisadores está acompanhando de perto o impacto do vírus da zika na saúde ocular dos bebês. Já foi possível verificar que crianças diagnosticadas com microcefalia apresentam problemas na retina e no nervo óptico. Mas especialistas alertam que as anomalias podem não se limitar às crianças com microcefalia, daí a importância de se fazer exames específicos em todos os bebês cujas mães podem ter tido contato com o vírus.
Um dos desafios que os médicos podem enfrentar nos próximos meses é a falta de estrutura adequada para examinar e acompanhar a evolução do quadro ocular dessas crianças. No Nordeste, só uma instituição tem o equipamento necessário para fazer imagens de alta resolução do fundo do olho, chamado RetCam: a Fundação Altino Ventura, no Recife. O oftalmologista Rubens Belfort Jr., professor da Universidade Federal de São Paulo (Unifesp) que está liderando estudos nesse campo, considera que o ideal seria ter pelo menos 20 equipamentos como esse em uma região endêmica como o Nordeste.
Teste do olhinho não é suficiente Ele alerta que o teste do olhinho – exame de rotina que deve ser feito em recém-nascidos – apesar de importante, não ajuda no diagnóstico dessas alterações. “É preciso fazer um exame chamado oftalmoscopia com a pupila dilatada para observar se há lesões na retina e no nervo óptico. O teste do olhinho detecta outros tipos de alteração”, diz Belfort. Para o especialista, há uma necessidade urgente de se desenvolver aparelhos mais baratos capazes de examinar o fundo de olho com precisão, como smartphones adaptados, por exemplo. Ao lado de especialistas de outras instituições, como a Fundação Altino Ventura, a Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz) e o Hospital Geral Roberto Santos de Salvador, Belfort já publicou artigos descrevendo essas alterações nas revistas médicas “The Lancet”, “JAMA Ophthalmology” e “Arquivos Brasileiros de Oftalmologia”.
No fim de fevereiro, oftalmologistas de todo o país se reuniram em São Paulo para discutir a emergência desses problemas durante um simpósio organizado pela Unifesp. “Na reunião, tivemos oftalmologistas de vários estados com experiência de vários pacientes com microcefalia e alterações oculares. O interessante é que essas alterações que descrevemos em Recife e Salvador são exatamente aquelas encontradas em outros estados, mostrando uma grande disseminação da doença em todas as regiões”, diz Belfort. “O mais importante foi o consenso a que chegamos de que é preciso alertar os pediatras que todo bebê com mães que tiveram zika ou um caso suspeito deve fazer exames oftalmológicos ainda no berçário.”
Acompanhamento dos bebês A oftalmologista Camila Ventura, da Fundação Alrtino Ventura, observa que, enquanto as alterações do nervo óptico já eram observadas em casos de microcefalia por outras causas infecciosas – como toxoplasmose e citomegalovírus -, as alterações na retina são uma novidade. “As alterações de retina não têm nada a ver com a microcefalia. São cicatrizes por alguma agressão. Temos a teoria de que elas são provocadas pelo vírus.”
Camila e seus colegas estão acompanhando um grande número de crianças afetadas pelo problema em Recife e o objetivo é repetir os exames a cada três meses para avaliar a curva de desenvolvimento visual das crianças. “A gente não sabe se essas lesões vão progredir. Elas podem ter como consequência desde uma visão subnormal até uma cegueira”, diz. Segundo ela, avaliações estão em curso para verificar se os problemas realmente estão aparecendo também nas crianças que não têm diagnóstico positivo para microcefalia e para descobrir qual a porcentagem exata dos bebês com microcefalia são afetados pelos problemas oculares. Para Belfort, dados iniciais apontam que ao menos de 30% a 40% dos bebês microcefálicos podem ter problemas oftalmológicos.
Fonte: G1
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